Com muito pé no chão e sem discursos motivacionais vazios, o International Journalism Festival, que acontece anualmente em Perúgia, na Itália, colocou em debate os desafios de empreender no jornalismo. O desenvolvimento de habilidades, as dificuldades de conseguir financiamento e a necessidade de criar modelos de negócio sustentáveis dominaram a conversa.
A discussão ocorreu na mesa “Media start-ups, entrepreneurship, innovation“. Conduziram o debate Adriano Farano, fundador da plataforma Pactio, voltada para financiamento direto de jornalistas freelancers; Djordje Padejski, representante do Knight Journalism Fellowship da Universidade de Stanford, um dos programas de jornalismo mais prestigiados do mundo; e Jim Louderback, CEO da VidCon, conferência anual na Califórnia que aponta as tendências da produção audiovisual na mídia.
Empreendedor, eu?
A dificuldade de se enxergar como empreendedor foi trazida para a discussão por Djordje Padejski. Repórter investigativo na Sérvia por mais 15 anos, hoje ele se destaca pelo desenvolvimento de soluções tecnológicas que auxiliam o jornalismo investigativo, como a FOIA Machine e a Veritza, ambas focadas em facilitar o acesso a documentos públicos.
Até pouco antes de trabalhar nessas soluções, ele sequer se enxergava como um empreendedor. “Eu pensava: ‘mas eu sou um jornalista'”, como se ambas as identidades fossem inconciliáveis. Porém, ao se deparar com a necessidade de criar novas possibilidades para continuar exercendo seu trabalho, notou que o caminho para melhorar o jornalismo era justamente a mentalidade empreendedora.
Mais que isso, hoje ele considera que jornalistas se convertem em ótimos empreendedores, pois já têm desenvolvidas algumas das habilidades necessárias. Por exemplo, segundo ele, a capacidade de ser um bom pesquisador e de contar bem histórias são comuns a ambas as atividades.
Além disso, a habilidade que o jornalista tem em construir relações e ser empático com as suas fontes é a mesma habilidade necessária para quem empreende e precisa construir sua rede de relações, tão necessária para expandir e contornar limitações.
Mas e o dinheiro para investir?
Se gerar dinheiro com um modelo que precisa ser reconstruído já é uma barreira para o jornalismo hoje, ter acesso ao capital de investimento pode ser um desafio adicional.
O público que acompanhava o debate ressaltou a dificuldade de às vezes obter capital para tirar projetos do papel. Jim Louderback sugeriu que o caminho deve ser deixar de lado investidores tradicionais. A maioria não está interessada em startups de jornalismo, pois normalmente estas não são escaláveis (potencial de crescimento rápido na produtividade e nos rendimentos sem demandar recursos na mesma proporção).
As campanhas de crowdfunding seriam uma boa alternativa nesse cenário, pois não estão contaminadas pelos interesses de lucro e de exploração do capital. O mesmo vale para os fundos de empresas que estão interessadas em investir em projetos de impacto social. Esta tem sido hoje uma das principais fontes de financiamento do jornalismo no mundo.
A maioria desses fundos é de empresas com sede nos Estados Unidos, então o desafio passa a ser procurar por aquelas que também investem em projetos estrangeiros. No Brasil, a Agência Pública é um dos exemplos de veículos cujo trabalho é assegurado por fundos internacionais, dentre outras fontes.
Um resumo simples para um problema complexo
Com muita objetividade, Adriano Farano resumiu a complexidade do problema para quem quer fazer parte do mercado das startups de jornalismo: “Precisamos cobrir histórias de uma maneira que seja sustentável economicamente e encontrar um modelo que seja ao mesmo tempo criativo e lucrativo, capaz de gerar dinheiro para os jornalistas.”
O debate completo sobre empreender no jornalismo
Você pode ver o debate completo no vídeo abaixo (em inglês):
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